segunda-feira, 26 de julho de 2010

O Amante


A luz caía do céu em cascatas de pura transparência, em trombas de silêncio e imobilidade. O ar era azul, podia-se apalpá-lo. Azul. O céu era aquela palpitação contínua do brilho da luz. A noite iluminava tudo, todo o campo das duas margens do rio a perder de vista. Cada noite era especial, cada uma era o próprio tempo de sua duração. O som das noites era o dos cães do campo. Uivavam para o mistério. Respondiam de aldeia em aldeia, até a consumação total do espaço e do tempo da noite. (DURAS, 2007. p.60)

Mais uma experiência fascinante com Marguerite Duras. Há alguns meses havia lido dois contos, "O homem sentado no corredor" e "A doença da morte", e ambos me induziram a inúmeras reflexões. Com minha mais recente leitura não foi diferente. Hoje terminei de ler "O Amante", a (provavelmente) mais conhecida obra da autora vietnamita, que a publicou aos setenta anos, em 1984. Sinto uma grande dificuldade para falar sobre o romance, pois é bastante diferente daquilo que costumo ler; não consigo dizer que me apaixonei pelo modo de narrar, pelas personagens, ou mesmo pelo enredo, como o faço com outros livros. Tudo nela é singular: a narrativa dividida em trechos fragmentários, os vários passados entrelaçados, a coerente incoerência das personagens, as palavras que se unem para formar não apenas uma história, mas imagens, sons, emoções. Ainda assim, agora que acabei de ler, sinto como se estivesse prestes a ter uma crise de abstinência das palavras de Duras. Reconheço que exagero, mas não deixo de afirmar que as palavras dela têm algo de enfeitiçante. Tentar explicar a experiência é inútil. Não há palavras que descrevam as palavras de Marguerite Duras senão elas próprias. Fica registrada, pois, a recomedação.

[...] a vida é imortal enquanto vive, enquanto está em vida. [...] a imortalidade não é uma questão de mais ou menos tempo, não é uma questão de imortalidade, é uma questão de alguma outra coisa que continua desconhecida. [...] é tão falso dizer qe ela não tem começo nem fim quanto dizer que ela começa e acaba com a vida do espírito, pos é do espírito que ela participa e da busca do vento. Olhem as areias mortas dos desertos, o corpo morto das crianças: a imortalidade não passa por ali, ela para e contorna. (DURAS, 2007. p. 75)

Referência:
DURAS, Marguerite. "O Amante". Tradução: Denise Bottmann. São Paulo: Cosac Naify, 2007.

post scriptum direcionado à senhorita artificielles
1. as cenas são no dia 06 de agosto, às 20h na Alvaro Moreyra, esteja lá.
2. sim, o neelic é o do HPSP.
3. O título do blog ficará assim temporariamente. Aceito sugestões se isto incomodar :)

Um comentário:

  1. mas é um nogentão!
    estarei lá, sim sinhô.
    coloca como título o "E agora, José?" :D

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